Lugar da delicadeza com o outro e com a própria Liberdade.

Onde se está de acordo com o único modo do humano de ser feliz

Monday, January 31, 2011

Nas asas da borboleta

No bater de asas da pequena borboleta teve início o tufão do outro lado do mundo. O terrível incidente, episódio da natureza, faz crer até hoje - em princípio - a tendência ao caos. As interrelações. Madeleine McCann está agora em algum outro lugar por um motivo simples que fez seus pais a deixarem com os irmãos gêmeos. Kate e Gerry foram absolvidos. Os gêmeos também.  

Que nas asas dessa pequena borboleta esteja a alegria de saber do fim em si mesmo. Cuidados com os filhos. Crianças vivendo ingenuidades, não negligências. Sem as naturais maldades a apavorá-las. As tragédias. Que impere a vontade de conhecer melhor o amor criando uma nova onda. Não caótica. Positiva no pensar.

Sei que o pessimista pode ser apenas um otimista com experiência. Mas um otimista pode criar uma nova realidade. Hoje somos capazes de construir tudo. Tudo no ambiente virtual. Então vamos recriar no universo real de boas possibilidades. É mais do que pensar. É crer. Acreditar. E alimentar ondas positivas. Nas asas da borboleta fazer vibrar universo mais justo. De bons impulsos. Ondas positivas em sua dimensão.

Há uma aposta alta que faço agora. Aposto com você todo o amor que dedico e bons pensamentos podemos transformar. É um ruflar colorido. Positivo. E que ninguém dedique seu olhar a outro ser humano senão de contemplação positiva. Mas do que crítica. Contemplar justo. Admirado e terno. Como ensinou Aristóteles. É profundo compreender o mundo.

Esse ruflar pode desencadear algo novo, além do espelho onde descrevemos a terra no centro do universo. Ou o humano adulto. Há outros centros. Pode haver um novo modo. Imprevisível e positivo. De criação contemplativa. Asas de borboleta, como no olhar de Julia Margeret Cameron, infância de asas e flores. Anunciação. Suave ruflar a recriar nosso pensamento.

Monday, January 24, 2011

Fotografia de tio

Olho para a janela do quarto e lá está ele. Em sua hospedaria dos Tempos Perdidos. Esse tio me ensinou a amar os livros, além do amor que já estava em mim. Ensinou-me o primeiro sentido sobre a leitura. Concordo ao ler seu amigo com nome que lembra “coquetel” escrever sobre sua cadência. Um escritor que se submete apenas à noite e ao mel. Com um desejo de felicidade cego, insensato e frenético. Que ora soa como hino, ora como elegia. Este é meu tio!

Em sua escrita identifico a sua busca por uma canção suprema. Sem precedentes. Um auge de beatitude. Em outros instantes percebo que se doz de forma a ensinar o valor da dor. Do empenho, do trabalho árduo, do sofrimento. A felicidade que só brota do grande esforço da semente e desabrocha como um poema lírico a invadir a floresta encantada da recordação.

Seu duplo impulso de felicidade ligou – me ao essencial. Conectou – me ao mais profundo da compreensão daquilo que pode habitar o pensamento em sentimentos humanos de suas próprias memórias. Descreve a alegria de esconder –se por trás da página até ouvir sentenças como “feche o livro, é hora do jantar”. O mesmo sentimento de grande esforço me invadia. Eu me escondia, meu querido tio. Procurava a árvore mais esquecida, subia nela. Ou ia até a torre erguida no terreno da casa e deixava que chamassem meu nome.

Como sua escrita como um biscoito agora, ao ouvir suas histórias de cocheiro e bebo o vinho tinto quente que quase derrama em meu colo no vai e vem da carruagem. Atravesso em sua companhia a ponte do nosso sonho em comum. Não é idêntico, mas semelhante.

Suas palavras em textos tecidos são a manta que me aquece agora. Nessa noite fria de nenhuma outra parecida. Não canso de preencher minha mochila de boas leituras como as tuas. Tecer bonitos bordados das melhores lembranças desenhadas por ti. Chego a sentir novamente o sabor do vinho quente com biscoitos que me ofereceste tão ternamente em noites frias.

Enquanto chacoalha a diligência que guias em terreno de sobressaltos sacode meu raciocínio e fico às voltas com o reconhecimento da ausência de um número. Sua paixão pelas figuras mais ternas também não me escapa. Não são comensais, mas as mais penetrantes e íntimas estruturas humanas que se confundem com as folhagens dos palacetes. Hipnotiza – me com a descrição dos ambientes em que diverte –se com o gosto por cerimônias e outros lazeres em suas colocações irônicas.

Seu apreço por descrever os prazeres desse grupo pequeno e organizado. Duro e simples em sua lógica dominante, que meu querido tio critica e analisa de forma verdadeira porque identifica seus defeitos e preconceitos em esnobismo. A tolice dos seus pressupostos. Amo sua liberdade e seu esforço de resistir à falta de fôlego. Suas crenças, sua atitude isenta em desenhar revelando o que está por dentro de todo esse ambiente em que viveu e reproduziu.

Deu – me a chance de mergulhos profundos em seus momentos de reminiscências de belas imagens. Quando também pude comer até o caroço de suas lembranças como a uma fruta doce que saboreei até o grão.

Castanha do pé de caju do sítio onde morei em tenra idade. Suas imagens me levaram a Paris várias vezes. Tanto que impregnaram em minha imagem e muitos me reconhecem como alguém que já havia estado na cidade. Até hoje ainda duvidam quando afirmo conhecer bem meu país. Foram os cenários que tão bem descreveste e comi. E impregnaram em mim.

Como cheiros e perfumes. Bebi como um recém – nascido bebe o leite saído do peito da mãe. Gostoso inesquecível a alimentar minha vida, então, tão insípida e abstraída de outros prazeres. Queira entender de tais prazeres e odores e a aura de abstração criada por ti encaixava em mim. Como uma manta me aquecer e cobrir meu corpo de menina aos onze anos.

Partilho hoje da tua falta de fôlego, meu terno tio. Porque, apesar de tudo, também me ergui e amei nessa vida. Também me dei aos tombos, aos valores perdidos de palpitações sinceras. Frases pensadas e não menos legítimas. Quanto pensar contigo aprendi. Ao ingressar no teu universo de dedicação ao indizível aprendi a conter a respiração e segurar pelo tempo que pudesse.

Tudo para recriar a realidade dos homens. Comungo da certeza de que também o fôlego me faltará no instante da morte. Também meus pulmões e todo meu sistema respiratório. Meu corpo inteiro não poderá conter o sopro intenso do desejo de recriação do mundo.  

Wednesday, January 05, 2011

Idade da razão


Chaleira fervendo sobre a mesa. O que mais aquece nesse Recife Inverno? Não pondero opiniões e suspeito dos não erros de quem só vai direto ao ponto. Sem desconto. Concerto do meu soneto. Calço as sandálias que perdera no caminho. Sei hoje quanto mereço. Vejo pouco menos com os olhos e pouco mais com o que sinto do entorno. Avisto na Boa Vista notas musicais saindo do asfalto. Palavras completas acompanhando os carros em velocidade. Vibro com o andar da carruagem.  

Muito ainda precisa ser feito. Diogo vendia doces ontem à noite nos bares. A mãe é carroceira. Ela está tirando um cochilo ali no 13 de Maio. Recebe bolsa família. Mas precisa de mais trocados. Explica o galego de cabelos não cortados. Não pode dormir tarde. E o horário da escola? Moça, eu estou de férias. Por isso, trabalho. A senhora vai ou não vai comprar o confeito ou me dar um trocado?

Posso fazer isso não, Diogo. Mas sente aí, coma alguma coisa. Depois você explica a sua mãe que criança na rua é perigo. À noite mais ainda. E que você ainda não tem idade para trabalhar desse jeito. E Diogo se espanta comigo. Eu já tenho 9 anos!!! Reagiu, indignado... Talvez pareça muito porque você já está cansado, não?  Não é isso dona. É que lá onde eu moro é muito pior do que aqui. E mesmo assim me safo. Não foi ninguém que mandou eu vender. Sou eu mesmo que quero. Prefiro muitas vezes estar aqui.

Diogo me deixou sem palavras. Enquanto ele comia, eu não sabia o que dizer.

Monday, January 03, 2011

Mel de abelha

O que é a compulsão por leitura? Por que não se pára de querer mais e mais ler quando se consegue entender o que está escrito? Outro dia, andava pela rua Dom Bosco, no bairro da Boa Vista e vi uma frase escrita no muro do lado direito. Estava escrito: “Corno é assim mesmo, lê tudo que vê”. É. Aceito. Corno deve vir do grego “Cornus”. Como no caso da palavra “unicórnio”. Um único chifre. Chifre que é cornus em grego. Fiquei pensando nisso. Pois chego à conclusão de que pode virar corno quem não lê. Acho que essa idéia de poder a ter chifres deixou as cabeças mais pesadas ao circular por aí. É como cabelo procurar cabelo em sapo. E todo mundo sabe que quem procura acha.

Vou tentar explicar minha teoria. Outro dia um amigo doutor em literatura, que está agora em Nova York, aconselhou me a deixar um pouco os livros e ir viver. Nesses impulsos de estar sem sair a muito tempo e carente de alguma atenção, quase que por distração, fazia nascer cornos em alguém que nem conheço. É. O mundo é assim e não é de agora. Mas ainda acho que quem lê não tem como ganhar esse adereço. Desde que aprenda a ler. A língua do outro. Não um outro como nesse não casa que quase me punha a bancar a decoradora. Mas a língua de quem está com você. Difícil é perceber e conter a tristeza diante da decisão do outro.

Quando o outro já quer, mesmo se você sabe ler, você vai virar corno. E quando lê, não pode mesmo evitar esse sofrer. Mas vai que o outro percebe sua excessiva atenção e tem algum coração. Aprender a ler pode fazer você evitar que um avião em pleno vôo aterrisse e deixe o outro a navios ver. Mas acho melhor ter mais preocupações com o que vai dentro da cabeça.  Ainda mais agora que até presidenta a gente já tem. 

Ao invés de perder tempo em frases como: “corno, ser ou não ser?”. Melhor mesmo é aprender a ler. Porque relembrou a mineira agora comandante do nosso barco, inesquecíveis mesmo são as palavras de Guimarães Rosa. Porque "o correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem". E ler, ler, ler e ler.

E se deixar nessa compulsão levar para outra dimensão. O que me faz lembrar uma amiga assim. Ela lê: bula de remédio, manual de instrução, composição de produto limpeza ou higiene pessoal. Lê gibi, revista, jornal, carta, enciclopédia, dicionário e livro.

Ela lê de tudo e faz da leitura diária um abrigo. Não sai de casa antes de ler o jornal. Não compra um produto antes de ler o que está na embalagem. Lê cada item descrito no manual, afinal saber do óbvio não faz mal. Revisa textos de jornal, cartaz de artigo feminino e até artigo científico. Lê as placas nas ruas para os filhos, mesmo que idades não tenham pra isso. O resultado é que um deles perguntou aos quatro anos, antes de alfabetizado, por que farmácia tem acento e o mesmo não acontece com supermercado? Deu provas de ser super dotado? Na opinião apenas estava esse menino acostumado a ouvir tantas palavras por sua mãe já ter tanto falado.

Mas essa minha amiga, chamada Débora, de abelha ou agora abelhuda, talvez, na sua visão, tem mania de olhar os classificados e só assim ficou sabendo do fim de um noivado. Viu o apartamento dos amigos recém-casados ali anunciado. Mas, voltando ao tema do texto, se corno é aquele que lê tudo o que vê ou se aquele que faz isso pode um dia corno vir a ser. Acho que prefiro o risco de ser corno, o que qualquer um de nós está vida inteira a correr, do que parar de ler. No entanto, na pior das hipóteses a minha amiga Débora que lê tudo, vai ser a primeira saber. Na pior das hipóteses.